A importância de Estudar o Dharma
Atualmente é comum vermos o discurso de que o estudo é algo secundário à prática religiosa ou espiritual, sendo muitas vezes desestimulado por determinados grupos, gurus ou seitas. Não é incomum vermos o clássico argumento de que a "vivência" é só o que importa, deslegitimando a importância do que se aprende com o estudo. Porém, se olharmos textos importantes, vinculados à tradição budista, veremos que o estudo é essencial para aqueles que buscam o Dharma. Afinal, a segunda das três jóias (Buddha, Dharma e Sangha) pode ser entendida como a sustentação, o caminho, os ensinamentos. Sem estudo dos ensinamentos, não há sustentação.
A escola Gelugpa do budismo tibetano enfatiza que não é possível alcançar a sabedoria sem o estudo prévio. Estudar, refletir sobre o que se estuda, aplicar o discernimento e meditar sobre isso são pontos essenciais para qualquer pessoa que se sinta atraída pela busca espiritual. Sempre devemos desconfiar ao nos depararmos com discursos que tentam desestimular o papel central do estudo como parte essencial da prática espiritual. Sem o estudo cuidadoso das tradições com as quais nos vinculamos ou nos sentimos afinados, o risco de cair em equívocos ou se deixar levar por superstições ou distorções do ensinamento é sempre grande.
A Perfeição da Sabedoria, Prajna-Paramita, é considerada a "mãe do Buddhas". Isto é, o despertar de um Buddha não acontece sem que antes haja sabedoria. A sabedoria não pode ser alcançada sem a meditação analítica acerca da natureza última do "eu" e dos fenômenos (o vazio de existência inerente, a interdependência de tudo). A meditação analítica (vipasyana) efetiva necessita também da meditação tranquilizadora (shamata), em que a mente se estabiliza no objeto de meditação. A estabilização só pode ser efetiva se estiver alinhada com uma conduta de vida virtuosa. O foco no desenvolvimento das virtudes enfraquece o poder das perturbações mentais que obscurecem a nossa compreensão da realidade. O entendimento necessário acerca das virtudes, de como adotá-las e dos vícios e como abandoná-los, do vazio de existência inerente, das etapas da senda do bodhisattva, só se dá por meio do estudo.
O estudo norteia a prática e a prática aprofunda o estudo. Estudar, investigar os textos, a história das tradições, dos personagens das escolas ou grupos com os quais nos associamos, ou sentimos afinidade, alimenta o poder do discernimento. O discernimento é a chave para não cairmos em enganos ou armadilhas, não nos tornarmos reféns da adoração ingênua, para sabermos corrigir o rumo se estivermos num caminho inadequado. O discernimento acerca da natureza última do "eu" e dos fenômenos também é a chave para que consigamos realizar a alquimia mental (lojong), de uma mente egoísta para uma mente altruísta. Portanto, o estudo alimenta o discernimento e leva à sabedoria, à compreensão profunda daquilo que foi refletido e analisado. A mente desperta e altruísta (bodhicitta) necessita da sabedoria (prajna), caso contrário, a noção de separatividade inerente não é superada.
Je Tsongkhapa (1357-1419)
No Lamrim ChenMo de Je Tsongkhapa, fundador da Escola Gelugpa, a importância de se comprometer com uma rotina de estudos, não só nesta, mas em todas as vidas, é resumida por esta citação de Geshe Sharawa (da antiga escola Kadampa):