segunda-feira, 18 de maio de 2020

O que é Teosofia

"A Teosofia é, então, a Sabedoria arcaica, a doutrina esotérica outrora conhecida em todo país antigo que pudesse se reivindicar como civilização. Esta "Sabedoria" mostram-nos os escritos antigos como uma emanação do Princípio divino; e a clara compreensão disto está tipificada em nomes como o Budh indiano, o Nebo babilônico, o Thoth de Memphis, o Hermes da Grécia; nas apelações, também, de algumas deusas -- Metis, Neitha, Athena, a Sophia gnóstica, e, por fim, nos Vedas, da palavra 'saber'." (Blavatsky, A Modern Panarion, p.263).


sexta-feira, 15 de maio de 2020

A Teosofia no século XXI

A Teosofia no Século XXI

Bruno Carlucci 




Num documento para a fundação da Seção Esotérica, hoje publicamente acessível em inglês (e em português) internet afora, Blavatsky, em sua tentativa de abrir uma porta para estudantes mais seriamente comprometidos com os ideais e o estudo da teosofia, esclarece o seguinte:

"Nenhum Mestre de Sabedoria do Oriente aparecerá ou enviará qualquer emissário à Europa ou América após esse período [31 de dezembro de 1899]...até o ano de 1975. Tal é a Lei pois estamos no Kali Yuga   - a Idade Negra - e as limitações deste ciclo, o primeiro cujos 5000 anos terminarão em 1897 são grandes e quase insuperáveis." (Blavatsky em seu memorando preliminar à Seção Esotérica. Trechos de tradução publicada pelo Círculo Blavatsky [CIBLA], Ano 01, 02, 1988). 

Nas cartas dos Mahatmas fica bem claro que Blavatsky era o ponto de contato deles com a Sociedade Teosófica e que após a sua morte, membros da Sociedade Teosófica (ou qualquer outra instituição) não teriam mais as facilidades de acesso a eles que (alguns) tiveram por meio de suas cartas.  

A base do ensinamento a ser disseminado pela Sociedade Teosófica são as obras escritas e editadas sob os auspícios desses Mahatmas. Obras, que embora não sejam perfeitas, pois seus escritores e editores, tais como Blavatsky (a mais avançada dentre eles e o ponto real de conexão dos Mestres com o restante da Sociedade, uma verdadeira Iniciada) não tinham a mesma estatura espiritual deles, ainda assim são o que de mais profundo há nessa literatura. Esta é a base para o pensamento teosófico moderno, os preceitos e princípios que expõem o norte da Religião-Sabedoria, seus ensinamentos fundamentais, as leis fundamentais e a ética necessária para quem aspira à senda gradual que leva à Sabedoria. 

Isso não significa se fechar num dogmatismo que ignora contribuições posteriores e importantes de muitos autores teosóficos que se mantiveram coerentes com a literatura original, nem ignorar tradições anteriores, fundadas por indivíduos de estatura espiritual ainda mais elevada que a da fundadora da Sociedade e citadas por ela e seus Mestres. Pois nunca foi o propósito que a Teosofia se encarcerasse numa igreja, num culto, nem que a Sociedade Teosófica (ou qualquer outro grupo teosófico) se apresentasse como o único caminho possível, mas que servisse de ponte para investigar e auxiliar no estudo das várias tradições que estão ligadas à Religião-Sabedoria. O propósito é que a teosofia seja mais uma vela, dentre outras velas, em meio a um mundo dominado pelas trevas do materialismo.  

Se houve um esforço dos Mahatmas após 1975, provavelmente foi por outros caminhos, em outras roupagens, de acordo com o que a humanidade precisava durante a transição do século XX para o XXI e, também, do que era mais viável e mais adequado para o momento. Porém, isso não anula o bem que o estudo da teosofia e que grupos teosóficos comprometidos com esse estudo ainda possam fazer (e fazem) para as pessoas. 

Aspirar aos degraus da escada de ouro e meditar sobre eles, aliado ao estudo cuidadoso da literatura original e das tradições por ela citadas, é uma boa prática a ser buscada por cada um, seja em sua busca individual ou em grupo, que almeja se conectar com a teosofia. Pois embora instituições, grupos, textos, tradições se percam com os movimentos da história, a Religião-Sabedoria é sempre a mesma e suas regras e preceitos nunca mudam: 

 1. Vida limpa.
 2. Mente aberta.
 3. Coração puro.
 4. Intelecto ardente.
 5. Clara percepção espiritual.
 6. Afeto fraternal para com todos.
 7. Presteza para dar e receber conselho e instrução.
 8. Leal senso de dever para com o instrutor. 
 9. Pronta obediência aos preceitos da Verdade.
10. Corajoso suportar das injustiças pessoais.
11. Destemida declaração de princípios. 
12. Valente defesa daqueles que são injustamente atacados.
13. Mira constante no ideal de progresso e perfeição humanos. 

(Tradução de A Escada de Ouro publicada pelo Círculo Blavatsky [CIBLA], Ano 01, 02, 1988). 


quinta-feira, 14 de maio de 2020

Plotino e as Proposições Fundamentais de “A Doutrina Secreta”

Plotino e as Proposições Fundamentais de “A Doutrina Secreta”


Rafael Nascimento*


TheoSophia

A Filosofia Esotérica não se caracteriza por ser velha! Ela não é um corpo de conhecimento inerte, caído em desuso, capaz de encontrar ressonância apenas nas mentes arcaicas ou lunáticas. Pelo contrário. A TheoSophia consiste em um sistema capaz de transformar nossa percepção embotada da realidade ordinária, expandindo nossa consciência, nos direcionando com segurança em uma caminhada que tem por objetivo a percepção da Verdade em todos os seus níveis. Ela se mantém atual, pois lança luz nos problemas mais urgentes e profundos do planeta: egoísmo, ganância, segregacionismo, dores e sofrimentos de todos os tipos, frutos da grande ignorância que assola a pobre e órfã humanidade. Mesmo assim ela não deixa de ser antiga, pois existe desde os primórdios do mundo, consistindo no próprio sistema de leis naturais (Gupta Vidya) que trouxeram nosso universo à manifestação. Um conjunto de Sábios, os grandes Magos, Mestres e Gurus de todas as eras, versados nesta filosofia, ensinam sua Doutrina Secreta aos que se encontram preparados. Por isso, disse Blavatsky: “Tais verdades não são, de modo algum, expostas com caráter de revelação; nem a autora tem a pretensão de se fazer passar por uma reveladora de conhecimentos místicos que fossem agora trazidos à luz pela primeira vez na história. A matéria contida nesta obra pode-se encontrar esparsa nos milhares de volumes que encerram as Escrituras das grandes religiões asiáticas e das primitivas religiões europeias – oculta sob hieróglifos e símbolos, e até então despercebida por causa desse véu.” (A Doutrina Secreta Vol. I) 

Dois autores e uma Verdade

Helena Petrovna Blavatsky nasceu em 12 de agosto de 1831 em Dnepropetrovsk, Ucrânia, e morreu no dia 8 de maio em Londres, na sede europeia da Sociedade Teosófica, situada na Avenue Road, número 19.

Helena casou-se, em 1849, com Nikifor Blavatsky, de quem herdou seu conhecido sobrenome, mas pouco tempo depois deixou seu marido e viajou pela Turquia, Grécia, Egito e França. Em 1951, encontrou seu Mestre em Londres, fato que mudaria drasticamente os rumos de sua vida. Andou pelo mundo e em meados da década de 1860, enquanto viajava entre tribos nativas do Cáucaso, enfrentou graves crises físicas e psíquicas, adquirindo controle completo sobre seus poderes ocultos, manifestados desde a infância.

Em 1868, partiu para o Tibet com seu Mestre. Anos mais tarde, em 1873, desembarcou em Nova York. Conheceu Henry Steel Olcott em 1874 e, em 1875, fundou a Sociedade Teosófica no dia 8 de setembro com Olcott, William Q. Judge e outros. Cel. Olcott fez o discurso inaugural em 17 de novembro. Em 19 de dezembro de 1882, transferiu a sede da Sociedade Teosófica de Nova York para Adyar, Madras (atual Chennai), na Índia, fixando assim a sede internacional da S.T.

Suas principais obras são “Isis sem Véu” (1877), “A Doutrina Secreta” (1888), “A Chave para a Teosofia” (1889) e “A Voz do Silêncio” (1889). Lançou sua primeira revista, “The Theosophist”, em 1879 e sua segunda, “Lucifer”, em 1887. 

Devemos a Blavatsky, figura extraordinária e devotada trabalhadora, a eclosão do movimento teosófico moderno do ponto de vista externo.

Plotino viveu de 205 a 270 d. C., nasceu em Licópolis, no Egito, e morreu em Roma. Pouco se sabe sobre sua vida. Seu discípulo, Porfírio, que também trabalhou como seu editor e biógrafo, conta que o “pai do neoplatonismo” nunca quisera que soubessem o local exato de seu nascimento, a data e sua filiação. Alguns autores afirmam que seus pais eram egípcios helenizados; outros, que eram romanos, mas devido aos pouquíssimos dados biográficos, estas são afirmações incertas. Plotino se negava a ter sua imagem retratada ou esculpida, porém outro de seus discípulos levou até ele, sem que ele soubesse, o maior retratista da época que em seguida desenhou-o de memória.

Aos 28 anos, Plotino mudou-se para Alexandria, maior centro cultural, filosófico e religioso da época, para que pudesse estudar. Despois de escutar vários expositores sem encontrar o que desejava, decepcionado, foi apresentado a Amônio Sacas (175-242 d.C.), historicamente o criador do vocábulo “TheoSophia”, e encantado com as exposições de seu futuro mestre, exclamou, segundo dizem: “Eis o homem que eu procurava”. Desde então, sucederam 11 anos de discipulado fiel até a morte de seu mestre, Amônio Sacas, que não deixou textos escritos e cujos discípulos comprometeram-se a não divulgar seus ensinamentos abertamente para que não fossem profanados. 

Com a morte de Amônio Sacas, Plotino, com 39 anos, decide juntar-se ao exército do imperador romano Górdio III, que partia em direção ao Oriente para combater os avanços do Rei persa Sapor I na Mesopotâmia. Sua intenção era entrar em contato direto com a sabedoria persa e hindu, pelas quais nutria profunda admiração, provavelmente infundida por Amônio.

Plotino começou a escrever aos 49 anos, após vinte anos de estudo e ensino de filosofia. Deixou 54 tratados que foram agrupados e editados por Porfírio em seis capítulos, compostos de nove tratados cada, intitulados, assim, de “Enéadas”.

A Sabedoria Antiga, resgatada e divulgada para o ocidente nos tempos modernos por H.P.B., foi chamada por ela de TheoSophia, ou Teosofia. Sendo assim, é clara a referência à escola de Amônio Sacas, na qual Plotino era um dos grandes discípulos iniciados. Dois autores, épocas distintas, uma só Verdade!

As Três Proposições Fundamentais
Blavatsky afirma no magistral proêmio que antecede as “Estâncias do Livro Secreto de Dzyan”, no Vol. I de “A Doutrina Secreta”, que antes que o leitor tome conhecimento das Estâncias, é de fundamental importância que ele apreenda três conceitos fundamentais “que informam e interpenetram todo o sistema de pensamento para o qual sua atenção vai ser dirigida”:

I.        Um Princípio Onipresente, Sem limites e Imutável, sobre o qual toda especulação é impossível, porque transcende o poder da concepção humana e porque toda expressão ou comparação da mente humana não poderia senão diminuí-lo. Está além do horizonte e do alcance do pensamento, ou, segundo as palavras do Mândûkya, é “inconcebível e inefável”. (...)

II.        A Eternidade do Universo in toto como plano sem limites; periodicamente “cenário de Universos inumeráveis, manifestando-se e desaparecendo constantemente”, chamados “as Estrelas que se manifestam” e “as Centelhas da Eternidade”. “A Eternidade do Peregrino” é como um abrir e fechar de olhos da Existência-por-si-mesma, segundo o Livro de Dzyan. “O aparecimento e o desaparecimento de Mundos são como o fluxo e o refluxo periódico das marés.” (...)

III.        A identidade fundamental de todas as Almas com a Alma Suprema Universal, sendo esta última um aspecto da Raiz Desconhecida; e a peregrinação obrigatória para todas as Almas, centelhas daquela Alma Suprema, através do Ciclo de encarnação ou de Necessidade, durante todo esse período. (...) (Vol. I)

A relação entre as Proposições e os ensinamentos de Plotino

Plotino ensinou sobre coisas diversas: o belo, a dialética, a origem dos seres. Entretanto, toda sua obra é norteada pelo conceito fundamental da Unidade Suprema de todas as coisas, ou o Uno, sendo simples e princípio que transcende a dualidade e todos os números, como a origem comum do que é múltiplo em manifestação: “O número, a quantidade, não é o primeiro (princípio). Evidentemente, antes da dualidade está a Unidade” (Plotino – As três Hipóstases Iniciais).

Como Platão, Plotino sustentava que o mundo das formas tinha sua origem no plano das Ideias, o númeno antecede o fenômeno, e que todas as formas materiais são moldadas a partir de uma Forma Ideal (Plano das Ideias). “Quando percebemos nos corpos uma Forma Ideal (eidos) que molda e domina a matéria informe – contrária à Forma Ideal – como uma Forma Ideal que se destaca e subordina as outras formas, apreendemos num único olhar a unidade que emerge da multiplicidade , a remetemos à unidade interior e indivisível, e entre ambas há concórdia e comunhão” (Sobre o Belo). 

Mas Plotino, em seu tratado Sobre a descida da Alma nos corpos, diz que “Tem de haver algo além da Unidade. Do contrário, todas as coisas teriam permanecido potenciais, desprovidas de forma. (...) Essa força não pode ser detida ou circunscrita por um ato de auto-apropriação (...)”, ou como propôs H.P.B., há “Um Princípio Onipresente, Sem limites e Imutável, sobre o qual toda especulação é impossível, porque transcende o poder da concepção humana e porque toda expressão ou comparação da mente humana não poderia senão diminuí-lo” – é a Raiz sem raiz de todas as coisas.

A segunda Proposição nos ensina a eternidade do Universo em essência, mas que sua manifestação é periódica como o fluxo das marés, manvantara e pralaya, atividade e dissolução. Analogamente, Plotino diz que “se alguém admira este mundo perceptível, observando sua dimensão, sua beleza, a ordem de seu incessante curso, os deuses que há nele – alguns dos quais são visíveis e outros invisíveis -, os espíritos e todos os animais e plantas, então que se eleve ao arquetípico dele (deste mundo perceptível), a uma realidade ainda mais verdadeira, e ali veja todas essas coisas de maneira inteligível e eterna, com sua própria consciência e vida (...). No entanto, também temos que incluir o Movimento e o Repouso. O movimento provém da alteridade do ato intelectual; e o repouso provém de sua identidade: para que possa haver o pensador e o pensamento; pois se a alteridade for excluída, haverá apenas o Uno e Silêncio”. (As Três Hipóstases Iniciais).

Por fim, como é dito na terceira Proposição Fundamental de A Doutrina Secreta, há uma profunda identidade entre nossas almas individuais e a Suprema Alma Universal. Plotino vê na contemplação do belo, a beleza da alma, um instrumento de elevação, já que o belo tem sua origem no Uno. “Caminhemos então em direção à origem e indiquemos o princípio que concede beleza às coisas materiais. Sem dúvida esse princípio existe. É algo perceptível ao primeiro olhar, algo que a alma reconhece a partir de um antigo conhecimento e, ao reconhecê-lo, acolhe-o e entra em ressonância com ele. (...) Então, precisamos subir de novo em direção ao Bem, para o qual tende o desejo de todas as Almas” (Sobre o Belo)

E a peregrinação obrigatória para todas as Almas, centelhas daquela Alma Suprema, através do Ciclo de encarnação ou de Necessidade? “Devemos recorrer ao divino Platão, que em muitas passagens de seus diálogos disse muitas coisas a respeito da alma (psykhé) e de sua descida no corpo (...). Diz que a Alma está acorrentada e sepultada nele (o corpo), qualificando como uma grande verdade a doutrina exposta nos mistérios de que aqui a Alma está numa prisão. Ademais, a meu ver, a caverna para ele, assim como o antro para Empédocles, significam este mundo (sensível), pois Platão interpreta a libertação das cadeias e a subida para fora da caverna como a jornada da Alma em direção ao Mundo Inteligível” (Plotino – Sobre a descida das Almas nos corpos).

Concluímos que a Teosofia, como afirmamos anteriormente e pudemos, mesmo que de modo breve e sucinto explanar, é atemporal, embora antiga como a história da humanidade e da formação dos globos de nossa cadeia planetária. Grandes instrutores guardam estes ensinamentos, que constituem o germe de toda filosofia e corrente de pensamento. Ensinam de tempos em tempos para que nossas almas recordem sua origem, e como afirmou “a glória da filosofia antiga”, Plotino, “advém daí que as almas individuais têm um desejo intelectivo de retornar ao princípio de que provieram”. 

Muitos séculos depois, Helena Blavatsky trabalhou intensamente por nos inspirar, para que nossas almas se tornem desejosas pelo retorno, concluindo o ciclo da Necessidade.

“O Mundo Arquetípico é a verdadeira Idade de Ouro” - Plotino

*Rafael Nascimento é membro da Sociedade Teosófica no Brasil, atua na Loja Unicidade em Cataguases (MG).