quinta-feira, 1 de junho de 2023

Gnosticismo: Separando o joio do trigo

    O que é chamado de "gnosticismo" é uma tradição vinculada a Jesus e seu círculo interno de discípulos, os ophitas, com influências de ensinamentos dos essênios e da tradição dos profetas em sua vertente mais esotérica, incluindo a kabbhalah dos nazarenos, a gnosis judaica e pré-cristã dos sethianos. Essa tradição refinada pelos ensinamentos de Jesus, o Vivo, flui por diferentes escolas posteriores, como os valentianos, marcionitas, mandeanos, maniqueus. Dentre expoentes daqueles que atuaram junto a Jesus, destacam-se João Lázaro, João Batista, Maria Madalena, Tomé, o Gêmeo. A literatura apócrifa, incluindo os textos descobertas em Nag Hammadi e os Manuscritos do Mar Morto, requer um estudo cuidadoso, com discernimento nessa busca pelo que seria o outro "cristianismo", caso a Igreja medieval não tivesse perseguido as antigas escolas gnósticas. Personagens como Filon Judeu, Bardenases, Mani, Paulo e outros também se destacam como verdadeiros representantes dessa linhagem gnóstica.

    Jesus não é o único Mestre iluminado deste mundo, nem é necessariemente superior a Zoroastro, Buddha, Lao Tzu, e muitos outros representantes de diferentes tradições que são ramos do grande tronco da Religião-Sabedoria. Mas Jesus é o grande representante e o refúgio da linhagem gnóstica. Não há gnosticismo sem o estudo dos ensinamentos de Jesus e seus discípulos. Mesmo na mística islâmica, na chamada gnosis islâmica do ismailismo, Jesus é tido em alta conta e os seus ensinamentos não são esquecidos. Jesus é o Mestre. Christo é o princípio divino, a luz presente no coração de todos os seres. Um gnóstico genuíno busca o despertar da compaixão, pois ama a todos os seres como a ama o Si Mesmo em seu coração, reconhecendo que esse Si Mesmo, esse "Self" (como diria Jung), é Christo, tanto em si, quanto nos demais. Não pode haver espaço para misantropia e ódio ao mundo, ódio às pessoas, ódio aos seres para quem busca esse caminho. Os arcontes estão dentro de nós e é dentro de nós que se dá a batalha entre o falso espírito e a Luz em nossos corações. Não adianta terceirizar a culpa em alieníginas, teorias da conspiração etc, nada disso faz parte da literatura gnóstica original. Jesus nunca falou em nada disso, assim como nenhum texto gnóstico antigo fala de magia sexual, retenção de sêmen etc. A câmara nupcial está em nosso coração, quando finalmente alcançamos a sabedoria de Sophia e a compaixão de Christo, acontece o casamento de sabedoria e compaixão e nos tornamos íntegros, nos libertando do poder da separatividade e do ciclo compulsório de reencarnações. Pois aí há a gnosis (a percepção clara, direta e intuitiva) da luz presente em tudo e nos elevamos para além das sombras de uma mente entorpecida pelas sensações e projeções de sua própria ignorância.
    As escolas gnósticas antigas desapereceram a partir da perseguição intensa da Igreja romana e do século IV em diante, praticamente não há mais escolas gnósticas físicas no mundo. O fluxo da tradição é interrompido. Organizações e ordens esotéricas modernas que se dizem gnósticas, escritores de ficção científica chamados de gnósticos, Matrix etc podem até ter alguma influência (mesmo que distorcida muitas vezes) dos ensinamentos gnósticos antigos, mas não têm ligação com a tradição original. Não existe igreja gnóstica, pois, nem Jesus, nem os seus discípulos fundaram tal coisa.
    O mais importante é buscarmos a gnosis, comprometidos com uma busca interna, num caminho que requer purificação de pensamento, palavra e ação por meio da prática das virtudes, da contemplação e do uso do discernimento para conseguirmos "separar o joio do trigo". Pois a verdadeira Eclesia não é deste mundo.
Que haja Luz!
"Pois bem, o Reino está dentro de vós, e também fora de vós. Se conseguirdes conhecer a vós mesmos, então sereis conhecidos e compreendereis que sois filhos do Pai vivo."
(Evangelho de Tomé)

Para conhecer mais sobre gnosticismo em português, recomendo os livros: A Gnosis de João, de Alaya Dullius e Alberto Brum (Ed. Garbha-Lux) e Bardesanes e os Hinos de Tomé: O Filósofo-Gnóstico de Edessa e as Canções dos Atos de Tomé (Ed. Garbha-Lux). Também recomendo o canal Viveka, de Aláya Dullius, no YouTube.
Site da editora: https://www.garbhalux.org.br/
Canal no YouTube: https://www.youtube.com/@VivekaAlaya



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