domingo, 5 de janeiro de 2020

Lama Tsongkhapa sobre o sofrimento

Je Tsongkhapa* - Lamrim ChenMo (Vol. I, cap. XVII):

"Ao entender que o karma contaminado produz o sofrimento do samsara, que as aflições (kleshas) produzem karma e que a concepção de um eu inerente é a raíz da perturbação das aflições (klesha-avarana),

Ao entender que é possível eliminar a noção de que há um eu inerentemente existente, você entenderá a verdade da cessação do sofrimento.

As oito marcas do sofrimento incluem: (1) o sofrimento do nascimento; (2) o sofrimento do envelhecimento; (3) o sofrimento da doença; (4) o sofrimento da morte; (5) o sofrimento de encontrar o que é desagradável ; (6) o sofrimento da separação do que é agradável; (7) o sofrimento de não conseguir o que quer; (8) o sofrimento dos agregados (skandhas - forma, sensação, percepção, tendências mentais, consciência dual)."

Esses 5 agregados (skandhas) que nos dão um senso de "eu": forma (rupa), sensação (vedana), percepção (samjna), formações/ tendências mentais (samskaras), consciência (vijnana) estão interligados e contaminados com as aflições, como a ignorância (avidya) de imputar uma existência inerente a esse eu e aos fenômenos ao redor, o apego ao "meu" e ao que me faz bem e a aversão ao que ameaça esse "eu" e o que chamo de "meu" ou ao que traz sensações desagradáveis ao "eu".

*Je Tsongkhapa (1357-1419) foi o fundador da escola Gelugpa e é considerado o grande reformador do budismo no Tibete. 


Je Tsongkhapa (centro), e seus dois principais discípulos abaixo, Gyaltsab (esquerda) e Khedrub (direita). 

quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Apolônio de Tiana - Parte I

Apolônio de Tiana

H.P.Blavatsky

Em A History of The Christian Religion To The Year Two Hundred, de Charles B. Waite, A.M., anunciado e analisado no periódico The Banner of Light (Boston), encontramos trechos da obra que trata de Apolônio de Tiana, o grande taumaturgo do segundo século A.D.*, jamais rivalizado por outro no Império Romano.

"Apolônio de Tiana foi o personagem mais impressionante daquele período... antes de seu nascimento, Proteus, um deus egípcio, apareceu ante a mãe de Apolônio e anunciou que ele encarnaria como o seu filho." 

Essa é uma lenda que, em tempos passados, fazia de todo personagem extraordinário um "filho de Deus", milagrosamente nascido de uma virgem. E assim segue a história.  
Apolônio de Tiana 
"Em sua juventude, Apolônio era famoso por sua beleza, seus poderes mentais e a sua vida ascética. Quando próximo dos cem anos de idade, foi levado ao Imperador de Roma, acusado de ser um "encantador", foi aprisionado de onde desapareceria, sendo encontrado no mesmo dia por seus amigos em Puteoli, a uma distância de três dias de Roma." (pp.90-92).

Alguns escritores tentaram tornar Apolônio um personagem lendário, enquanto cristãos zelosos insistiriam em chamá-lo de impostor. Se a existência de Jesus de Nazará fosse tão bem atestada pela história e ele tivesse sido tão bem conhecido por escritores clássicos como Apolônio, nenhum dos céticos atuais poderia duvidar da existência do filho de Maria e José.

Apolônio de Tiana foi amigo e correspondente de uma Imperatriz romana e de vários imperadores, enquanto que sobre Jesus pouco restou nas páginas da história, como se a sua vida tivesse sido escrita nas areias do deserto. A sua carta para Abgarus, o príncipe de Edessa, cuja autenticidade é outorgada apenas por Eusébio - o Barão de Munchausen da hierarquia patrística - é chamada em A View of the Evidences of Christianity, "uma tentativa de fraude" até mesmo pelo teólogo Paley, cuja fé aceita as história mais incrédulas. Apolônio, portanto, é um personagem histórico, enquanto que muitos dos dos "pais apostólicos", quando investigados sob o olhar da crítica histórica, começam a dissipar-se e a desaparecer como o fogo fátuo.

Publicado originalmente em The Theosophist, Vol. II, No. 9, June, 1881, pp. 188-189.
*N.T. (nota do tradutor): GRS Mead em suas pesquisas evidencia que Apolônio teria vivido no século I AD.   
GRS Mead, Secretário de Blavatsky, esceveu a obra Apolônio de Tiana: Sábio, Profeta e Renovador dos Mistérios (ed. Teosófica), baseando-se em diferentes relatos, como o de Filóstrato, resgatando a importância desse personagem para estudiosos de teosofia, do cristianismo primitivo e das tradições de mistérios. Mead dedicou a vida ao estudo do hermetismo, do gnosticismo cristão antigo e de personagens importantes que de alguma forma contribuíram ou interagiram com os grupos e escolas dos primeiros cristãos. 
Assim como Blavatsky, em Ísis em Véu vol. III e nos artigos presentes no vol. 5 de A Doutrina Secreta, a obra de Mead foi precursora das descobertas de evangelhos apócrifos e de evidências de uma outra história do cristianismo no século XX, mostrando um outro Jesus, não um mártir da ortodoxia, mas um Mestre elevado. Logo posterior ao período de Jesus (que de acordo com as pesquisas de Mead teria sido no final do séc. I a.c.), Apolônio, também um Mestre elevado, um pitagórico, surge interagindo com diferentes escolas e personagens de sua época. 

Para mais informações sobre Mead e sua obra, clique aqui.

quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

Blavatsky e o ano novo

 1888

Helena Petrovna Blavatsky 
As pessoas geralmente desejam a seus amigos um feliz e, às vezes também acrescentam “próspero”, ano novo a seus amigos. Sob o número sombrio de 1888, não há muitas chances de felicidade ou prosperidade para aqueles que vivem em prol da Verdade; mas, ainda assim, o ano é anunciado pela gloriosa Vênus-Lúcifer, brilhando de forma tão resplandecente que tem sido confundida com outra visitante ainda mais rara, a estrela de Belém. Certamente que, com ela também presente, algo do princípio Christos deve nascer sobre a terra em tais circunstâncias. Mesmo que a felicidade e a prosperidade estejam ausentes, é possível encontrarmos algo maior que ambas neste próximo ano. Vênus-Lúcifer é a patrona de nossa revista e como escolhemos vir à luz sob seus auspícios, também desejamos tocar a sua nobreza. Isso é possível para todos nós individualmente, e, em vez de desejarmos um próspero ou feliz ano novo a nossos leitores, sentimo-nos mais propensos a pedir-lhes que tornem o ano digno de seu arauto brilhante. Podem assim fazê-lo aqueles que são corajosos e resolutos. Thoreau destaca a existência dos artistas da vida, pessoas que podem mudar a cor do dia e torná-lo belo para aqueles com quem têm contato. Nós afirmamos que há Adeptos, Mestres da vida, que a tornam divina, como a todas as outras artes. Não seria esta a maior de todas as artes, aquela que afeta a própria atmosfera na qual vivemos? Que se trata da arte mais importante percebemos de imediato ao nos lembrarmos de que cada pessoa  a respirar o sopro da vida tem um efeito sobre a atmosfera mental e moral do mundo e contribui para colorir o dia daqueles ao seu redor. Aqueles que não ajudam a elevar os pensamentos e as vidas dos outros, necessariamente, paralisam-nos por sua indiferença se não estiverem a ativamente arrastarem-nos para baixo. Quando este último ponto é alcançado, a arte da vida se converte na ciência da morte; vemos o mago negro em ação. E ninguém pode ser completamente inativo.
Embora muitos livros e retratos ruins sejam produzidos, nem todos que são incapazes de escrever ou pintar bem insistem em fazê-lo de forma ruim. Imaginem o resultado se assim o desejassem! Entretanto, o mesmo se aplica à vida. Todos vivem, pensam e falam. Se todos os nossos leitores que têm alguma simpatia para com Lúcifer se esforçassem em aprender a arte de tornar a vida não só bonita, mas também divina e se comprometessem a não mais serem levados pela descrença na possibilidade desse milagre, mas iniciassem a tarefa hercúlea de uma vez por todas, então 1888, por mais pouco auspicioso que seja o ano, seria devidamente conduzido pela estrela radiante.
A felicidade e a prosperidade nem sempre são as melhores companhias para mortais pouco desenvolvidos como a maior parte de nós; elas raramente trazem consigo a paz, que é o único contentamento permanente. A noção de paz é geralmente conectada com o fim da vida e um estado de consciência religiosa. Esse tipo de paz, porém, geralmente traz consigo o elemento da expectativa. Os prazeres deste mundo foram subjugados e a alma aguarda alegremente com a expectativa dos prazeres da próxima vida. A paz da mente filosófica é muito diferente e pode ser alcançada cedo na vida, quando os seus prazeres mal foram experimentados, bem como quando já foram completamente bebidos. Os transcendentalistas americanos descobriram que a vida poderia se tornar sublime sem auxílio sequer de circunstâncias ou fontes de prazer e prosperidade. É claro que isso já foi descoberto muitas vezes antes, e Emerson apenas assumiu novamente a súplica de Epiteto. Mas toda pessoa deve descobrir esse fato novamente por si mesma, e uma vez tendo compreendido isto, ela sabe que será miserável caso não se esforce em tornar tal possibilidade em realidade na sua própria vida.
O estoico se tornou sublime porque reconheceu a sua própria responsabilidade absoluta e não tentou fugir dela; o transcendentalista ainda mais, pois tinha fé nas possibilidades desconhecidas e não testadas dentro de si. O ocultista reconhece plenamente a responsabilidade e reivindica o seu título após ter testado e adquirido o conhecimento de suas próprias possibilidades. O teosofista que tem seriedade vê sua responsabilidade e esforços para encontrar o conhecimento, vivendo, nesse ínterim, de acordo com os padrões mais elevados de que tem consciência. A todos eles, Lúcifer os saúda! A vida do Homem está em suas próprias mãos, o seu destino pertence a si mesmo. Então, por que 1888 não deveria ser um ano de desenvolvimento espiritual maior do que todos em que vivemos anteriormente? Depende de nós mesmos para assim fazê-lo. Esse é um fato real, não um sentimento religioso.
Num jardim de girassóis, cada flor se volta para a luz. Por que não fazemos o mesmo? Que ninguém imagine se tratar de mero capricho dar importância ao nascimento do ano. A terra passa por suas fases definidas e o ser humano com ela; e se um dia pode ser colorido, um ano também pode. A vida astral da terra é jovem e forte entre o Natal e a Páscoa. Aqueles que formularem seus desejos agora terão força extra para realizá-los com diligência.
[Artigo originalmente publicado na revista Lucifer, Vol. I, No. 5, Janeiro de 1888, pp.
337-338. Traduzido por Bruno Carlucci em dezembro de 2017. Revisado em dezembro de 2019].